[A leitura de Pretérito Perfeito por Carla M. Soares]
Doce e agressivo, bom de ler, mau de ler, livro para adorar e detestar, mesmo gostando... Tudo fácil e tudo terrivelmente difícil neste livro. Percebe-se melhor se acrescentar que a temática é a morte? Assim, com limpeza, sem rodeios: a morte. Morte jovem, por concretizar e todavia à partida concretizada, porque inevitável. Nós perante as páginas, naquele momento da peça, mesmo no fim da primeiro acto, quando se adivinha o cair do pano. Devia haver segundo acto, terceiro, mas desengane-se o público ao mesmo tempo que a personagem - logo nas primeiras linhas fica o aviso, é peça de um acto só. Metáfora aparte, como assistir à vida com prazo de validade? Com dor?
Não, nem por isso. O peso da morte está nas páginas, claro, suspendemo-nos dele no receio de vê-la chegar a qualquer momento. Mas não há comiserações nem o facilitismo do drama, não há a constância da lágrima, da repulsa ou da revolta de uma morte jovem - e injusta, são sempre injustas estas falhas do nosso corpo, se o nosso corpo ainda prometia muitos anos de outras falhas. Há pelo contrário memórias em que, com a melancolia de quem já sente a falta, se celebra a vida - é a vida, é a vida! - num deambular pelos avanço dos dias à sombra da inevitabilidade, pelos momentos de outro tempo que se guardam como tesouros... E entre os pedacinhos de vida a morte nunca nos chega, expira a validade e a personagem que aprendemos a estimar permanece. Os mais óptimistas de nós podem fechar as páginas com a esperança de um engano. Não há engano, mas a esperança é coisa boa.
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