15/03/2015

A Viagem de Sebastião



[texto de Pedro Almeida Maia]

Devia ter começado na aldeia alentejana de Cousa Vã, pela ternura do Intrínseco de Manolo, pela sua azinheira secular e pela magia da linguagem popular, mas eis que me chega às mãos a obra-prima Dizem que Sebastião. Começar pelo fim já não é cousa inédita, muito menos para homens de barba rija — como são os benfiquistas, nada nos mete medo. É de ausência de medo que João Rebocho Pais está munido.

Também conhecido como Red Jan, o autor e comissário-dos-céus lisbonense arranca parte da sua alma viajante e entrega-a — de bandeja — a Sebastião Breda, um executivo importante que vê a sua vida a andar para trás (daí começarmos pelo fim). Depois de um jantar desastrosamente divertido, Sebastião ouve o seu médico aconselhá-lo a parar, a mudar de vida. Nem imagino o autor na pele de Sebastião, nunca desejando o mesmo, mas admitindo que não gosta de gente mentirosa nem de demagogias. Mesmo não sabendo tocar música, João Rebocho Pais enche as estórias de melodias faladas, pausas inteligentes e mestrias orquestradas.

Num livro obrigatório para os amantes da literatura, não só por de um grande livro se tratar, mas também por ser um livro sobre outros livros, sobre outros escritores e as suas estátuas, João Rebocho Pais convida o leitor a uma viagem ao encontro de Pessoa, Eça e Luís Vaz. Mas não só. Entre os que Sebastião passa a conhecer, eis que surge a margem açoriana, inspiradora, a veia poética de Antero de Quental. E despertei para mais um regresso ao passado. Mais uma viagem às origens!

Se não conhecia Sebastião, quero conhecer Manolo e o seu âmago, porque João Rebocho Pais tuteia as palavras, as frases, com paixão tal que nos aprisiona, nos arrebata, com a entrega contemplativa e filosófica do mistério que é a vida. Mas não voa só: convida-nos a ver o mundo de cima, de fora da caixa. João Rebocho Pais dá-nos asas.

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