João
Rebocho Pais é um
homem inteiro, cheio de jogos (e) de palavras. Desses, com força para sondar as
palavras, as dominar e chutar, certeiramente. Sim, falo da escrita e também desse desporto
que move paixões,
porque a literatura também
pode ser comparada com a seriedade imensa de um jogo de futebol. Um jogo onde
cada vitória e
derrota do Benfica é vivida
de uma maneira intrínseca
por João, mas
também por
cada um dos benfiquistas. Não
apenas aquilo que se passa dentro das quatro linhas; mas também a partilha. Parte de um povo em uníssono, a deixar-se
unir pelo mesmo sentimento, a mesma crença,
a mesma cor, as mesmas alegrias, as mesmas tristezas. Como na literatura. Dois
olhos a mais ou a menos fazem toda a diferença.
Escreve-se para os outros. Quem sabe, um dia, com os outros?
Duas paixões
na vida de João
- os livros e o Benfica -, somadas a outras tantas, com as maiores nos filhos,
Francisco e Miguel, e as restantes nos prazeres à
volta, como a simples contemplação
de uma árvore
ou uma estátua.
É assim, João Rebocho Pais:
feito de sorrisos desarmantes e olhos divertidos de quem acabou de pregar uma
partida ao mundo. Ou foi o mundo que te pregou uma partida a ti?
O escritor surgiu por acaso; o comissário de bordo também. Mas tanto pega
nas malas (mesmo que se tornem pesadas), como nas canetas, que, nos dias que
correm, também
já não são penas.
Hoje é
um escritor com dois livros publicados. O primeiro, "O intrínseco de
Manolo", surgiu inesperadamente, por um decisivo e milagroso acaso. O
segundo, "Dizem que Sebastião",
foi natural, o esperado de uma voz original, cheia de humor, que disfarça a crueza da vida
e que se quer ouvir. O caminho é
bonito e apetece.
João
é um escritor
obstinado, leal às
amizades e, sobretudo, a si próprio.
Um escritor que não
cruza os braços,
antes pelo contrário,
transforma-os rapidamente em asas e leva os seus livros às nuvens. Essas, que estão mesmo a seguir às janelas dos aviões.
Escreve histórias
de amor, mas também
de solidão, de
personagens que redescobrem a essência
da vida. Mesmo que seja no seu ocaso. O importante é deixar a alma, serena, voar feliz
como os pássaros
que se interrogam sobre os humanos. Como é
que se consegue essa leveza, João?
Relativizando o que pouco ou nada interessa. Ter a consciência de que viver é uma graça da natureza.
Parece fácil,
mas não é. Lendo João Rebocho Pais,
talvez o consigamos aprender. Pelo menos o suficiente para que neles, nos seus
livros, fiquemos. Ou para que eles fiquem dentro de nós.
"Cousa Vã
guardara lugar em sua vida, habitava um espaço importante como o são todos os que nos
ocupam a mente, que nos trazem tesouros que sabemos guardar, isso confessava
Manolo à árvore,
com ela dividindo a vez de regressar a esse tempo, trazendo histórias de tantos dias
passados, partilhados, onde haviam aprendido a cumplicidade que os unia. Manolo
envelhecia, e isso a árvore
ia percebendo, aumentando-lhe a sombra, para que assim com ela descansasse
sossegado. E, ainda que vivendo mil anos, era árvore
velha também."
O Intrínseco de Manolo (pág.170)
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